Acompanho com preocupação, desde junho, as manifestações
Brasil afora e, salta aos olhos os mais variados casos divulgados pela mídia no
que tange à desmedida forma de abordagem com que os aparatos de segurança
pública dos estados vêm tratando aqueles que, usufruindo de um direito
constitucional, protestam, democraticamente, nas ruas das grandes cidades do
país.
Aliás, se voltarmos um pouquinho no tempo, foi a partir de
uma repressão violenta na cidade de São Paulo, que o movimento ganhou força e levou
multidões às ruas. Não raro ouvimos
relatos de distribuição farta de golpes de cassetetes, tiros de borracha a esmo
(que levaram à cegueira profissionais de imprensa que cobriam os eventos), uso
indiscriminado de spray de pimenta, desrespeito verbal e violência moral.
O espaço não me permite uma análise mais profunda das causas desse desrespeito sem fim, mas nossa tenra democracia responde com
uma estatística pavorosa: apenas no Estado do Rio, de 2007 a 2013,
desapareceram 35 mil pessoas, numa média diária de 16 pessoas. Se levarmos em consideração que os números
refletem apenas o Estado do Rio e que a guerra do Vietnã matou em 10 anos 55
mil pessoas, podemos afirmar com segurança que vivemos em um estado de guerra
contínuo há tempos, afinal, que outro país do mundo democrático tem índice
pior?
O ato de atirar (mesmo balas de borracha), utilizar spray de
pimenta ou, mais recentemente, ameaçar manifestantes com choques paralisantes
que, dependendo da carga e da pessoa, podem levar à morte, é apenas a parte
visível de uma prática secular de uma convivência desrespeitosa, que acontece
indiscriminadamente em comunidades carentes, praticada pelo Estado e que, em
função do momento que vivemos, foi exportada para as ruas pelas mesmas forças
que agem fora da lei, lá. Só que no
asfalto, os holofotes jogaram luz e escancararam o problema. E ele é grave,
gravíssimo.
E, das duas uma: ou não existe comando (e quando digo comando
estou me referindo a políticas públicas
de segurança que envolvem a cadeia Federal, Estadual e Municipal) que faça a
tropa seguir por um outro caminho que não o da violência, com cursos e
reciclagem que humanizem os seres que vão para as ruas, ou a tropa, apesar de
todas as diretrizes e recomendações, não obedece seus superiores.
Temos um histórico de desrespeito crônico que permeia todos
os setores da sociedade, da saúde à educação, passando pelo transporte público,
apenas para ficarmos nos temas de cobrança da moda. A corrupção é endêmica. Prestam-nos serviços de quinta categoria
quando pagamos impostos de primeiro mundo.
Está sendo convocada pelas redes sociais uma gigantesca
manifestação para o dia 7 de setembro onde são esperadas milhões de
pessoas. É dever das autoridades
responsáveis pela segurança, em suas várias esferas, garantir a livre e
democrática manifestação, garantir a ordem (com equilíbrio) e coibir possíveis
excessos.
Apesar de a classe política ter ignorado os anseios da
sociedade nas manifestações de junho, não é hora de aceitar provocações. Pressionar, sim. Aproveitemos
a sorte que ainda passeia por essas bandas e não nos obrigou, até agora,
a enterrar nenhum herói ou mártir por conta de operações desastradas de nossas
polícias.
Em um planeta que com poucos toques no computador se sabe o
que suecos, suíços ou dinamarqueses, por exemplo, recebem de seus governos em
troca dos impostos pagos, o significado da palavra desrespeito, aqui, ganha
contornos de tragédia nacional.
A resposta lhes daremos em outubro do ano que vem.
Abraços sustentáveis