O jornalismo deixou de ser um elemento de apoio para causas, para tornar-se ele mesmo uma causa. A sociedade precisa de jornalismo independente e é preciso pagar por isso.
A crise do modelo de financiamento do jornalismo não tem nenhuma relação mais expressiva com a crise política e econômica que se instalou no Brasil a partir de 2013. É uma crise de modelo de negócio e tem mais a ver com algoritmos do que com competência das mídias ou qualidade do jornalismo oferecido à sociedade. O modelo de financiamento ao jornalismo segue no Brasil um padrão quase universal, anunciantes que precisam dar publicidade a seus produtos buscam empresas jornalísticas e compram espaços em suas páginas. E assim foi por muito tempo.
No entanto, a entrada da internet em campo colocou um “tubarão no aquário” das empresas de jornalismo. Dois fatores são fundamentais para compreender o impacto que as novas tecnologias tiveram na produção jornalística. De início pensou-se que internet e jornalismo seriam “irmãos siameses”. No entanto essa lua de mel durou pouco. Uma das primeiras constatações dos editores foi que o público da internet é viciado em “conteúdos grátis”. Ora, jornalismo custa caro, reportagens mobilizam recursos, tempo, profissionais. Ah, e apenas como registro, jornalismo é profissão, assim como médico, bombeiro ou professor, precisa ser remunerada com salários.
Outra dura realidade é que o valor pago pelos anunciantes na internet é muito baixo, não garantindo a subsistência de projetos de jornalismo. A esse cenário juntaram-se as grandes empresas que atuam com base em algoritmos, que tem acesso a grandes públicos, como o Google, Facebook, grandes portais e outros, que podem oferecer um recorte de consumidores com muita especificidade. Apesar do jornalismo, principalmente o jornalismo segmentado poder oferecer um recorte de público, jamais conseguirá concorrer em volume de acessos com os grandes portais.
Neste cenário é importante refletir nobre o papel e a importância do jornalismo para as sociedades democráticas. Não há democracia sem imprensa livre, esse é um dos grandes valores do exercício do jornalismo. Assim como outras profissões garantem direitos, o jornalismo assegura o direito da sociedade à informação.
No caso de mídias segmentadas, há dois cenários distintos: o primeiro é de mídias setoriais, que representam os interesses de uma categoria empresarial ou econômica. Essas normalmente são mantidas por empresas do setor que representam. No segundo cenário, há meios que representa causas ou temas de maior subjetividade, tais como: educação, ciência, saúde, meio ambiente ou sustentabilidade. Estes são assuntos de extrema relevância para a sociedade, mas que não representam diretamente interesses de empresas, a não ser no caso de alianças de marca, para ganhos de reputação.
Tempos atrás ouvi de um colega jornalista uma excelente definição sobre o jornalismo. Ele disse: “Existem apenas dois tipos de jornalismo, aquele que trabalha com o que o público quer saber e aquele que trabalha com o que o público precisa saber”. Esta definição separa o jornalismo em dois campos, sem nenhum juízo de valor ou demérito. No entanto, o jornalismo necessário, aquele que define valores para a democracia e para o desenvolvimento do processo civilizatório, esse encontra muita dificuldade em se financiar.
Durante muito tempo as empresas e organizações que publicam esse jornalismo de causas buscou financiar suas atividades a partir da lógica tradicional da publicidade. Não está dando certo. Muitas publicações estão fechando ou reduzindo suas atividades por conta da falta de recursos. O modelo de publicidade não funciona mais nem com os grandes meios. É preciso desenvolver uma nova lógica de apoio ao jornalismo, a causa a ser patrocinada não é mais o tema, mas o próprio exercício do jornalismo.
Uma sociedade complexa como a brasileira não pode prescindir de jornalismo e da cobertura dos mais diversos temas de interesse social e ambiental. Na busca por apoio as organizações e empresas que publicam mídias socioambientais e científicas devem mobilizar esforços para mostrar aos financiadores a necessidade de ter o jornalismo como uma causa relevante para a sociedade, e não apenas seus temas de interesse.
Publicações dos mais diversos matizes temáticos carecem de apoio. No caso específico das mídias socioambientais, desde o início de 2015 a crise de financiamento já vitimou diversas. Grandes eventos como a Copa do Mundo e Olimpíada são verdadeiros sorvedouros de recursos publicitários de empresas, não restando muito para distribuir a outros temas.
A retomada da economia, a implementação de metas como os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, a aplicação das metas definidas pelo Acordo de Paris, a melhoria da educação e o apoio informativo ao desenvolvimento humano não podem prescindir de meios capazes de debater, analisar e informar com profundidade cada um dos temas de relevância. Portanto, é necessário nos meios empresariais, principalmente aqueles que apoiam os conceitos de sustentabilidade e protagonismo civilizatório, uma reflexão sobre seu papel no financiamento aos processos sociais de informação. Uma avaliação sobre o tipo de jornalismo que financiam para a sociedade. (#Envolverde/Utopia Sustentável)
Dal Marcondes
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