Nações Unidas, 6/8/2015 – Após mais de dois anos de intensas negociações, os 193 Estados membros da Organização das Nações Unidas (ONU) acordaram por unanimidade a Agenda de Desenvolvimento Sustentável, com 17 objetivos, que incluem a erradicação da pobreza extrema e da fome e que devem ser alcançados até 2030.
Em entrevista coletiva concedida no dia 3, o representante permanente do Quênia, Macharia Kamau, um dos facilitadores do processo consultivo intergovernamental, informou que a implantação da agenda poderá custar a bagatela de US$ 3,5 trilhões a US$ 5 trilhões por ano. E acrescentou que esse valor parece astronômico, comparado com as centenas de milhões de dólares (não trilhões) que a ONU requereu tradicionalmente para ajuda ao desenvolvimento.
É uma meta “ambiciosa, mas não inatingível”, afirmou Kamau, e poderia ser coberta com recursos internos, tanto públicos quanto privados. “Todos os países têm de estar à altura das circunstâncias, afirmou, acrescentando que é imperativo que o setor empresarial participe.
De todo modo, o subsecretário-geral de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU, Wu Hongbo, da China, se mostrou mais cauteloso quando afirmou aos jornalistas que “será muito difícil dar cifras específicas”. Espera-se que os 193 Estados membros das Nações Unidas mobilizem recursos internos para ajudar a cumprir os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), acrescentou. Esses são os sucessores dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), que foram aprovados pela Assembleia Geral em setembro de 2000 e cujo prazo vencerá em dezembro deste ano.
As novas metas, que serão parte da agenda de desenvolvimento pós-2015 da ONU e deverão ser aprovadas em uma cúpula de líderes mundiais que acontecerá entre os dias 25 e 27 de setembro, cobrem uma ampla gama de assuntos políticos e socioeconômicos. Entre eles se destacam pobreza, fome, igualdade de gênero, industrialização, desenvolvimento sustentável, pleno emprego, direitos humanos, educação de qualidade, mudança climática e energia sustentável para todos.
Jean Martens, diretor do Global Policy Forum, com sede em Bonn, na Alemanha, acompanha de perto as negociações, e disse à IPS que a nova Agenda de Desenvolvimento Sustentável é o resultado de um doloroso processo de criação de consenso. “A nova agenda é única, pois é universal e contém objetivos e responsabilidades para todos os países do mundo, incluídos os ricos e poderosos”, acrescentou.
Martens destacou que a Agenda aborda as crescentes desigualdades dentro dos países e entre eles, bem como as enormes disparidades de oportunidades, riqueza e poder. Alguns dos novos ODS são muito ambiciosos. Por exemplo, o primeiro, que propõe a erradicação da pobreza em todas suas formas e em todas as partes. Porém, a Agenda é muito menos ambiciosa no tocante aos meios de implantação, alertou o diretor do Global Policy.
“A implantação dos ODS exigirá mudanças fundamentais na política fiscal, na regulação e na governança mundial. Mas o que encontramos na nova Agenda é vago e, por isso, não basta para disparar a proclamada mudança transformacional. Mas objetivos sem meios suficientes não têm nenhum sentido”, ressaltou Martens.
Bhumika Muchhala, analista de políticas, finanças e desenvolvimento na Rede do Terceiro Mundo, apontou à IPS que os ODS são muito mais ambiciosos do que as Metas do Milênio, mas que boa parte desse dinheiro virá de duas fontes estratégicas.
De um lado, fundos privados, por meio das associações que a ONU consagra no ODS 17, bem como vários outros processos, como a Iniciativa de Energia Sustentável para Todos ou o Mecanismo Global de Financiamento. E, por outro, fundos internos, obtidos diretamente dos cofres dos países do Sul em desenvolvimento, por não haver compromissos de aportes internacionais.
Segundo Muchhala, a flagrante ausência de um processo intergovernamental ou modelo de governança em torno desse tipo de associações de múltiplos atores as deixa vulneráveis na falta de responsabilidade e transparência, bem como de rigor em avaliações independentes e outros processos de monitoramento por terceiros.
Shannon Kowalski, da Coalizão Internacional pela Saúde das Mulheres, opinou à IPS que os ODS são um importante passo adiante, especialmente para mulheres e meninas. Com esse novo contexto, se gera o potencial para realmente mudar as regras do jogo e promover a igualdade de gênero, que se reconhece como absolutamente essencial para o desenvolvimento sustentável, acrescentou. “As mulheres e as meninas de todas as partes têm muito a ganhar com os ODS. Mas, para que isso seja realidade, temos que continuar pressionando os governos para que cumpram seus compromissos”, destacou.
Ian Koski, porta-voz da ONE Campaign, observou que os novos objetivos mundiais são um marco no esforço para acabar com a indigência. “O monitoramento desses objetivos deverá centrar-se particularmente na responsabilidade, apoiada por investimentos na coleta de dados e em seu uso, para que os cidadãos tenham a informação que precisam para garantir que os líderes cumpram suas promessas”, afirmou.
Para o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a nova agenda de desenvolvimento “acompanha uma agenda universal, transformadora e integrada, que anuncia um histórico ponto de inflexão para nosso mundo. Esta é a Agenda do Povo, um plano de ação para acabar com a pobreza em todas suas dimensões, irreversivelmente, em todas as partes e sem deixar ninguém para trás. Busca garantir a paz e a prosperidade, e forjar associações que tenham como núcleo as pessoas e o planeta”.
Deon Nel, do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), disse: “Felicitamos os negociadores por sua ousada ação. Essa é uma medida essencial para a realização de nosso sonho de dar forma a um mundo onde as pessoas, o planeta e a prosperidade se unam”. Para ele, o novo plano de desenvolvimento representa uma melhora significativa em comparação com as Metas do Milênio, pois reconhece a complexa relação entre a sustentabilidade dos serviços do ecossistema, a erradicação da pobreza, o desenvolvimento econômico e o bem-estar humano. Envolverde/IPS/Utopia Sustentável
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